A redução dos níveis do colesterol LDL (LDLc) é parte integrante do plano terapêutico na redução do risco cardiovascular. As evidências são ainda mais robustas em pacientes com doenças cardiovasculares estabelecidas (ASCVD). As diretrizes clínicas recomendam a monoterapia com a dose mais alta tolerada de estatina antes de considerar algum agente adicional para atingir a meta de colesterol LDL. Na abordagem de outras condições de risco, particularmente na hipertensão, a preferência tem recaído sobre a combinação de agentes com diferentes mecanismos, sendo observada maior eficácia e menor incidência de eventos adversos. Surge a questão: chegou a hora da terapia combinada na dislipidemia?
A ezetimiba inibe a absorção intestinal do colesterol, com consequente diminuição do aporte de colesterol ao fígado. A redução das reservas hepáticas leva a aumento da expressão do receptor de LDLc, com maior depuração do colesterol circulante. A terapia combinada alcança maior redução das concentrações de colesterol LDL do que dobrar a dose de estatina. Isso também contribuiria para a redução dos efeitos adversos ou potenciais intolerâncias relacionados à terapia com estatinas de alta intensidade.
Terapia combinada: novos dados
Buscando trazer novos dados sobre o tema, foi publicado recentemente o estudo RACING no The Lancet. Trata-se de estudo randomizado, aberto e de não inferioridade realizado em 26 centros clínicos na Coreia do Sul. Participaram 3.780 pacientes com ASCVD randomizados 1:1 para receber rosuvastatina 10 mg + ezetimiba 10 mg versus rosuvastatina 20 mg, seguidos por 3 anos. Não foi observada diferença na incidência do desfecho primário (morte cardiovascular ou evento cardiovascular não fatal) entre os grupos (9,1% no grupoR+E vs 9,9% no grupo R), o que atendeu à não inferioridade.
O grupo de terapia combinada alcançou níveis significativamente menores de LDLc (58 x 66 mg/dL). Concentrações de LDLc inferiores a 70 mg/dL em 1, 2 e 3 anos foram mais frequentes em 73%, 75% e 72% nos pacientes no grupo de terapia combinada (73% , 75% e 72% vs 55%, 60% e 58% respectivamente, todos com significância estatística).
A descontinuação ou redução da dose do medicamento por intolerância foi significativamente menor no grupo de terapia combinada (88 [4,8%] vs 150 [8,2%] pacientes, p<0,01). Efeitos colaterais musculares objetivos, associados a elevação de CPK, não alcançaram diferença entre os grupos. No entanto, efeitos colaterais subjetivos, como mialgia, foram significativos. Esses achados podem ter sido influenciados pelo efeito Nocebo, sendo mais valorizados em virtude do desenho aberto do estudo.
Metas de LDLc: onde estamos?
Dados de mundo real mostram baixa implementação das medidas recomendadas pelas diretrizes de tratamento da hipercolesterolemia; no estudo DA VINCI, a terapia com estatina de alta potência, no contexto de prevenção secundária, estava em uso apenas em 38% dos pacientes e a combinação estatina-ezetimiba em 9%, embora 62% estivessem acima das metas de LDLc. No estudo GOULD, apenas 17,1% dos pacientes com ASCVD e colesterol LDL acima da meta tiveram suas medicações intensificadas: sendo 5,8% com intensificação de estatinas e 5,3% com adição de ezetimiba. O início precoce da terapia combinada pode ser medida efetiva no combate a essa inércia terapêutica. Assim, uma maior proporção de pacientes alcançará as metas recomendadas.
Seria a hora de uma mudança de paradigma, implementando a terapia combinada na dislipidemia como uma opção de tratamento inicial?